Entrei no quarto e fui atingida pelo cheiro fraco de incenso e perfume amadeirado, o chuveiro estava ligado e sussurrava baixinho no outro cômodo. Suas roupas estavam largadas de qualquer jeito sobre a cama, como se não pudesse esperar se livrar delas e tivesse arrancado de seu corpo assim que possível. Não era a primeira vez que eu entrava em um quarto barato de motel, com a cama desconfortável e ar burocrático, mas sentia uma pontada de ansiedade no fundo do estômago. Acho que é assim que a pantera se sente logo depois de avistar sua presa. Deixei meu casaco em uma cadeira e me aproximei da porta entreaberta do banheiro, de onde escapava vapor. Quando vi seu cabelo molhado e suas costas nuas, comecei a salivar. Lambi os lábios, nervosa, sedenta. Bati na porta com os nós dos dedos para anunciar minha chegada e encostei meu quadril na pia, de onde podia observa-lo. - Você quer companhia? Meus dedos já acariciavam o tecido de minha roupa, inquietos, esperando um sinal de aprovação...
Assume-se que seres da noite como eu sentem repulsa por seres da luz, como anjos e outros parecidos com eles; mas não poderiam estar mais errados. Se não é a imensa vontade de corromper tudo o que é bom e belo, o que nos atrái é o caráter às vezes malicioso, enganador, como o das fadas. Tive minhas experiências com pessoas assim. Naquela noite em específico, entrei num clube noturno como tantos outros. Ultimamente um anjo, dentre todas as criaturas, andava frequentando os inferninhos comuns às outras raças. Era impossível não notá-lo: além do brilho dourado que emitia, estava cercado de mulheres de diversas espécies, todas hipnotizadas pela possibilidade de estar perto de um anjo. Claro que era bonito. Alto, dos olhos verdes e a pele tão branca e uniforme que parecia pedra. Parecia incrivelmente entediado, muito mais interessado em fumar um cigarro lentamente do que dar atenção à alguma de suas várias acompanhantes. Reconheci algumas das moças cujo olhar estasiado varria aquele rosto...