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Caçada

Entrei no quarto e fui atingida pelo cheiro fraco de incenso e perfume amadeirado, o chuveiro estava ligado e sussurrava baixinho no outro cômodo. Suas roupas estavam largadas de qualquer jeito sobre a cama, como se não pudesse esperar se livrar delas e tivesse arrancado de seu corpo assim que possível. Não era a primeira vez que eu entrava em um quarto barato de motel, com a cama desconfortável e ar burocrático, mas sentia uma pontada de ansiedade no fundo do estômago. Acho que é assim que a pantera se sente logo depois de avistar sua presa.
Deixei meu casaco em uma cadeira e me aproximei da porta entreaberta do banheiro, de onde escapava vapor. Quando vi seu cabelo molhado e suas costas nuas, comecei a salivar. Lambi os lábios, nervosa, sedenta. Bati na porta com os nós dos dedos para anunciar minha chegada e encostei meu quadril na pia, de onde podia observa-lo.
- Você quer companhia?
Meus dedos já acariciavam o tecido de minha roupa, inquietos, esperando um sinal de aprovação. Ele virou o rosto na minha direção e depois de um olhar rápido para minhas coxas expostas, sorriu - e pude sentir suas segundas intenções como se ele tivesse me atirado um drink no rosto. Senti meus joelhos fraquejarem e meu coração bater tão rápido que conseguia ouvir o som do sangue fluindo na minha cabeça. Dei alguns passos e descartei minhas roupas, tentando parecer casual, embora sentisse que meus nervos fossem cordas de violão e vibrassem levemente. Me aproximei devagar e não conseguia tirar os olhos das gotas de água que escorriam por suas costas. 
Algo rugiu de satisfação quando estendi as mãos e toquei sua cintura, deslizando as mãos ensaboadas.  Ele se virou para me encarar de frente e a intensidade de seus olhos era tanta que senti meu couro cabeludo arrepiar. Ele estendeu um braço e me encurralou entre seu corpo e a parede.
A sensação da proximidade estava deixando meus sentidos sobrecarregados e tive que fechar os olhos para gravar os detalhes de seu corpo nu. Mesmo assim, conseguia sentir ele se aproximar, abaixando lentamente o rosto e varrendo o meu  com sua respiração quente. Abri os olhos para vê-lo bem próximo, a encarar meus lábios com curiosidade, os seus próprios entreabertos antecipando o momento. Cruzei o curto espaço que ainda existia e o beijei suave e tentativamente. Levei as mãos ao seu cabelo e embrenhei meus dedos nele, puxando seu rosto em minha direção enquanto senti seus braços se fecharem ao meu redor. A pressão de seus dedos parecia estar me marcando a fogo, e por onde eles passavam sentia um rastro de calor, como se minha pele estivesse coberta de uma fina camada de gelo que ia se derretendo.
Toquei seu pescoço com os lábios, experimentando a pele áspera por conta da barba. Suas mãos se moviam em um frenesi, apertando e descobrindo tudo o que alcançassem, e seus quadris pressionavam os meus. Experimentei mordê-lo de leve, bem sob o maxilar, e a resposta foi um suspiro profundo cuja frequência vibrou através dos meus ossos. Achei o ponto mais macio, e arrisquei uma mordida um pouco mais forte. Firmei meus dedos dos lados de seus quadris e o puxei com força na minha própria direção, fazendo com que ele deixasse escapar um gemido surpreso. A pressão que eu fazia com os dentes começou a aumentar, e quando finalmente a pele se partiu, senti seu corpo tremer e relaxar. Ele tinha tido um orgasmo, mas minha refeição estava apenas começando.

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