Uma estranha, dentro de seu carro esporte do último ano, cruzou os batentes da citadela. Levou o carro pelas ruelas até se aproximar da floresta. Abandonando o carro, seguiu a pé por uma pequena trilha entre as últimas casas.
Apoiada na janela, uma senhora cujas rugas podiam dar-lhe mais de 100 anos, apertou os oblíquos olhos azuis para a visitante e sussurrou:
- Ora, mas voltou, Madie...
O rosto cansado se voltou para a velhinha. Os grandes olhos cor de noz pareciam tristes e vazios, círculos roxos e profundos os haviam sulcado naquela face.
- Pois é, vó Gilda. A filha pródiga, à mãe retorna...
Ela foi se afastando, e as casas foram ficando pra trás. O vento gelado do começo do inverno rodopiada em torno de seus tornozelos, balançando seu vestido e atravessando seu casaco. Sentia sua pele arrepiar por baixo do tecido, mas já era tarde demais.
Atravessou o limiar formado pelas árvores e foi seguindo por uma trilha meio escondida pelo mato, a luz diminuindo enquanto o sol se punha. Cantos estranhos ecoavam, mas ela não se deixava assustar. Caminhou por mais meia hora, até a luz do sol desaparecer quase completamente e, um pouco mais a frente, projetar-se a silhueta de uma casinha.
Foi se aproximando, os passos cada vez mais rápidos. Era uma construção muito antiga, as paredes feitas de pedra e as janelas e porta, de madeira escura. Ela respirou fundo e atravessou o batente, imediatamente mergulhada na atmosfera da casa, velha e amarelada. Parecia que estivera ali há mil anos, e a casa envelhecera de acordo.
As paredes estavam cobertas de teias de aranhas, e uma infiltração deixara o chão cheio de lodo velho. O piso gemia sob seus pés, a madeira já apodrecida. Uma goteira se instalara em cima da única cama, e embora o colchão e os lençóis tivessem a pesada pátina do tempo, lhe pareciam quase novos comparados com o resto da casa.
Deixou a sala-quarto e verificou a cozinha, com azuleijinhos pintados à mão. Também coberta de lodo e com uma camada tão grossa de poeira que formara uma crosta. Nem se atrevia a ir do lado de fora olhar o banheiro. Aquela casa, mesmo tão rústica, já vira dias melhores.
Ainda sob os últimos raios de sol, vó Gilda se perguntava se Madie sabia que, ao anoitecer, ela viria... A escuridão também levara seu marido e filhos; seria uma pena se levasse Madie. Há tantos anos ela fora embora, e por mais triste que o olhar dela fosse, ainda via nele um reflexo da menininha alegre que deixara a cidade.
Madie, no entanto, estava muito certa do que fazia. Espanou um tanto da poeira, despreocupada, de uma cadeira, e arrastou-a para perto da janela. Abriu-a, e ali ficou, vendo os últimos rosa e dourados irem desaparecendo ao longe. Sentiu-se engolfada por uma imensa paz.
Mal caía a noite e ela sabia que a escuridão já vinha. Rápida e fria como um vento de inverno, Madie viu o manto negro ir se aproximando, como uma onda de água negra, primeiro vindo pelo chão, depois engulfando tudo que seus olhos alcaçavam.
Madie jamais viu a luz do sol novamente.
Apoiada na janela, uma senhora cujas rugas podiam dar-lhe mais de 100 anos, apertou os oblíquos olhos azuis para a visitante e sussurrou:
- Ora, mas voltou, Madie...
O rosto cansado se voltou para a velhinha. Os grandes olhos cor de noz pareciam tristes e vazios, círculos roxos e profundos os haviam sulcado naquela face.
- Pois é, vó Gilda. A filha pródiga, à mãe retorna...
Ela foi se afastando, e as casas foram ficando pra trás. O vento gelado do começo do inverno rodopiada em torno de seus tornozelos, balançando seu vestido e atravessando seu casaco. Sentia sua pele arrepiar por baixo do tecido, mas já era tarde demais.
Atravessou o limiar formado pelas árvores e foi seguindo por uma trilha meio escondida pelo mato, a luz diminuindo enquanto o sol se punha. Cantos estranhos ecoavam, mas ela não se deixava assustar. Caminhou por mais meia hora, até a luz do sol desaparecer quase completamente e, um pouco mais a frente, projetar-se a silhueta de uma casinha.
Foi se aproximando, os passos cada vez mais rápidos. Era uma construção muito antiga, as paredes feitas de pedra e as janelas e porta, de madeira escura. Ela respirou fundo e atravessou o batente, imediatamente mergulhada na atmosfera da casa, velha e amarelada. Parecia que estivera ali há mil anos, e a casa envelhecera de acordo.
As paredes estavam cobertas de teias de aranhas, e uma infiltração deixara o chão cheio de lodo velho. O piso gemia sob seus pés, a madeira já apodrecida. Uma goteira se instalara em cima da única cama, e embora o colchão e os lençóis tivessem a pesada pátina do tempo, lhe pareciam quase novos comparados com o resto da casa.
Deixou a sala-quarto e verificou a cozinha, com azuleijinhos pintados à mão. Também coberta de lodo e com uma camada tão grossa de poeira que formara uma crosta. Nem se atrevia a ir do lado de fora olhar o banheiro. Aquela casa, mesmo tão rústica, já vira dias melhores.
Ainda sob os últimos raios de sol, vó Gilda se perguntava se Madie sabia que, ao anoitecer, ela viria... A escuridão também levara seu marido e filhos; seria uma pena se levasse Madie. Há tantos anos ela fora embora, e por mais triste que o olhar dela fosse, ainda via nele um reflexo da menininha alegre que deixara a cidade.
Madie, no entanto, estava muito certa do que fazia. Espanou um tanto da poeira, despreocupada, de uma cadeira, e arrastou-a para perto da janela. Abriu-a, e ali ficou, vendo os últimos rosa e dourados irem desaparecendo ao longe. Sentiu-se engolfada por uma imensa paz.
Mal caía a noite e ela sabia que a escuridão já vinha. Rápida e fria como um vento de inverno, Madie viu o manto negro ir se aproximando, como uma onda de água negra, primeiro vindo pelo chão, depois engulfando tudo que seus olhos alcaçavam.
Madie jamais viu a luz do sol novamente.
Comentários