Ela colocou a escova de cabelos em cima da penteadeira e encarou pela última vez o reflexo louro de olhos azuis, enquanto ouvia ele se aproximar. Guardou os grampos na gaveta, espantou as lágrimas dos olhos com a ponta dos dedos e ficou encarando as próprias mãos, depositadas em cima de suas coxas.
Passos pesados, de pés dentro de coturnos militares, vinham ao seu encontro no mesmo ritmo de seu coração lento e descompassado. Ela segurava os soluços como se segurasse sua vida. Mordia o lábio que insistia em tremer, denunciando-a.
Os passos pararam às suas costas, mas ela jamais se atreveria a encarar o reflexo do espelho. Ali encontraria os duros olhos azuis de Matthäus, e se pegaria de novo admirando os traços fortes do seu rosto, o modo como seu cabelo loiro era cuidadosamente aparado, as narinas levemente infladas quando ele estava furioso.
Ela vestia o presente que ele havia lhe dado, o lindo vestido tomara que caia que tanto pedira, cor azul cobalto. Nunca estivera mais bonita. Ele pôs a mão em seu ombro, e sentiu a pele pálida arrepiar-se sob seus dedos.
- Amelie... - ao contrário do que ela imaginava, a voz dele não retumbava como uma tempestade furiosa. Era um sussurro, rouco, tomado de dor. - Por que fez isso comigo, Amelie?
- Cansei-me de repetir que é mentira, Matthäus. Se não consegue acreditar no meu amor, se prefere realmente acreditar que o traí, eu lhe imploro... tire a minha vida agora mesmo.
Ela o ouviu tirar a arma do coldre, o clique suave do engatilhar. Fechou os olhos e os apertou, deixou seu lábio tremer incontrolável, sentiu os dedos dele em seu ombro e esperou o tiro que acabaria com tudo.
Ouviu o estampido. A mão se soltou do seu ombro. Ainda fechava os olhos, mas as lágrimas escorriam por seu rosto. Então assim era morrer? Abriu os olhos e viu seu próprio reflexo no espelho, a maquiagem borrada. E para seu espanto, atrás de si, jazia morto o único amor de toda uma vida.
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