Pular para o conteúdo principal

Conto primeiro

Os cabelos brilhantes e de cor violenta, num estranho corte jovem, balançavam-se em volta de seu rosto como um halo. Ela corria e a cena sensual e juvenil de seus seios balançando fazia com que vários homens se virassem ao vê-la passar, e seu ar rebelde fazia as velhas senhoras balançarem a cabeça.
Entrou na pequena loja de Earl, quase deslizando na madeira recém encerada e tocando o sininho perto da porta. Tudo ali parecia ser de outro século, até o próprio Earl. Ele era um boticário, e as prateleiras empoeiradas da loja continham toda sorte de vidrinhos com líquidos coloridos, quase um caleidoscópio. O velhinho, de olhos azuis e pele de seda, devia estar nos fundos fazendo suas preciosas fórmulas.
Curiosa, contornou o balcão e pôs-se a examinar detidamente cada garrafinha de tamanho e cor diferente - cada uma parecia um pequeno tesouro, com suas cores vívidas e aura misteriosa. No entanto, um vidrinho chamou sua atenção. Era verde jade o líquido dentro dele, viscoso, porém líquido; de textura semelhante ao mel. Os dedos dela coçaram, e o vidrinho foi repousar em seu bolso direito.
Saiu da loja num frenesi mágico, sentindo o contorno através do tecido do casaco. Saltitou até o terraço de sua pequena casinha onde sorveu o líquido como um néctar dos deuses. Como escorria pela garganta! Imediatamente, sentiu a substância espalhar-se por seu corpo como uma gota de tinta escura se espalha num copo com água. Sentiu o bem estar... e fechou os olhos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Stacatto parte I

Assume-se que seres da noite como eu sentem repulsa por seres da luz, como anjos e outros parecidos com eles; mas não poderiam estar mais errados. Se não é a imensa vontade de corromper tudo o que é bom e belo, o que nos atrái é o caráter às vezes malicioso, enganador, como o das fadas. Tive minhas experiências com pessoas assim. Naquela noite em específico, entrei num clube noturno como tantos outros. Ultimamente um anjo, dentre todas as criaturas, andava frequentando os inferninhos comuns às outras raças. Era impossível não notá-lo: além do brilho dourado que emitia, estava cercado de mulheres de diversas espécies, todas hipnotizadas pela possibilidade de estar perto de um anjo. Claro que era bonito. Alto, dos olhos verdes e a pele tão branca e uniforme que parecia pedra. Parecia incrivelmente entediado, muito mais interessado em fumar um cigarro lentamente do que dar atenção à alguma de suas várias acompanhantes. Reconheci algumas das moças cujo olhar estasiado varria aquele rosto

À coragem

Para a cavidade sob o sexto par de costelas Minha querida companheira, Todos esses anos não percebi sua companhia, delicadamente movendo as peças quando necessário, mas acho que é chegada a hora de reconhecer seu mérito. Obrigada por ter me carregado através dos anos mesmo quando eu não conseguia enxergar o caminho a frente, ou me empurrado nos braços de determinadas oportunidades às quais eu não iria sozinha.  Nunca fui de me considerar uma pessoa corajosa, mas vejo que sou, sim, nas pequenas coisas. Eu escolhi andar descalça em um terreno em que a terra se mistura a espinhos, sendo totalmente genuína e aberta sobre o que sinto enquanto a maioria das pessoas se fecha. Espero que você me leve pela mão durante mais um ano. Afetuosamente, Juliana.

Cachoeiras do universo

Observei a tez bem escura de uma moça, cujo cabelo se punha como uma coroa de cabelos crespos, e imaginei como diria a ela que sua cor é belíssima. Imagino que nos confins do universo, o céu se transforma em água e jorra em cachoeira para se desfazer em nada. Todos os dias, uma das deusas leva um jarro na cabeça para colher a água e reabastecer um pequeno poço. Ela tem a pele da cor dos grãos de café e o corpo delgado, com um fino e elegante pescoço onde a cabeça divina repousa, o cabelo crespo cortado bem baixo de modo a fazer pequenos círculos onde deveriam ser cachos. Vestida de laranja e dourado, seu ventre hoje está menor que o normal pois ela deu a luz recentemente. A menina veio como um bebê frágil e que quase não respirava. Sábia, a mãe-deusa banhou o bebê no céu escuro sem estrelas e garantiu a ela a cor divina que tinha por direito. Mas não digo nada.